O BENFIQUINHA E A APOLOGIA DO DOWNSIZING

Vivemos tempos difíceis no Benfica. Mais do que o miserável desempenho do futebol (o que só por si já é muito mau), é a ausência de soluções para sairmos deste registo de mediocridade. A liderança do Benfica continua a insistir numa fórmula gasta e sem futuro. É a fórmula do benfiquinha de Vieira. 

No futebol consumou-se o inevitável. 

Sabia-se que a continuidade de Bruno Lage estava irremediavelmente comprometida. Um técnico que já tinha saído das boas graças dos adeptos, que teimava em não proporcionar um futebol empolgante, situação que a ausência de resultados já não permitia disfarçar, com uma posição fragilizada no balneário e que, evidentemente, já não era a aposta pessoal do presidente. 

Era, como foi, o bode expiatório ideal para o insucesso em que se tornaram os últimos 6 meses do futebol do Benfica. 

A saída de Bruno Lage, embora inevitável, não é, contudo, a solução para os problemas do Benfica. 

Os problemas do Benfica residem na sua liderança… mais concretamente, no topo da hierarquia. 

Uma liderança sem audácia para aproveitar os sucessos desportivos internos e, dessa forma, dar o salto competitivo que deveria recolocar o Benfica na elite do futebol mundial. 

Uma liderança que gere o Benfica de forma desapaixonada e que, por não sentir essa chama imensa, não consegue perceber o potencial da marca e não sabe qual o lugar que o clube deveria ocupar no mundo do futebol. 

Uma liderança que privilegia os rankings das transferências e aposta no campeonato do betão em detrimento do verdadeiro sucesso desportivo. 

Uma liderança que, para satisfazer interesses alheios ao clube e para salvar a sua posição (e a aparente sensação de poder que daí resulta), conduz o Benfica para uma estratégia de downsizing competitivo. 

Uma liderança que promove um benfiquinha sem relevância no mundo do futebol. 

Um exemplo desta ausência de ambição e de audácia e desta miopia estratégica, fruto da incompetência da liderança e da sua ação assética no clube, é precisamente a sucessão de Bruno Lage. Para treinar o Benfica só poderá servir um dos melhores treinadores do mundo. Para liderar um projeto que se pretende verdadeiramente ganhador, só um treinador carismático, experiente, competente e conhecedor do que é o Benfica… mas não é certamente Jorge Jesus. 

Não vou comentar sob o ponto de vista técnico o mito sebastiânico do Jorge Jesus defendido de forma velada por alguns visionários. 

Sobre este tema apenas refiro que, depois do que foi dito e feito por todas as partes, muito dificilmente Jorge Jesus será o treinador consensual capaz de unir a família benfiquista em torno de um projeto desportivo verdadeiramente ambicioso. Não vale a pena, assim, desperdiçarmos recursos escassos (em contexto de gravíssima crise económica com impactos devastadores na indústria do futebol) com uma solução que é claramente fraturante no seio do universo benfiquista. 

Mais, a 3 meses das eleições, o desperdício de tais recursos escassos na contratação de um treinador que não é consensual e que apenas teve um sucesso moderado com plantéis de luxo é um ato de gestão danosa. 

Jorge Jesus foi o técnico com mais títulos no Benfica? O verdadeiro sucesso desportivo não se mede através do número de taças da liga conquistadas e nem sequer através do número de títulos de campeão em Portugal. 

A generalidade dos adeptos de futebol por esse mundo fora não quer saber dessas competições para nada. Nem sequer se mede pelo número de finais da Liga Europa atingidas. Trata-se da segunda divisão do futebol europeu e qualquer coisa que não seja a vitória nessa competição será sempre um mau desempenho. O verdadeiro sucesso desportivo mede-se pelo desempenho na Liga dos Campeões da UEFA, prova onde todos os adeptos de futebol do mundo têm os olhos postos… e neste capítulo também o Benfica de Jorge Jesus não deixou boas recordações. 

Foi o técnico que conseguiu colocar o Benfica na liderança do ranking das transferências de atletas e durante a sua passagem o Benfica registou um aumento considerável de receitas? O desempenho financeiro é apenas um meio, mas não o fim. Contudo, o desempenho financeiro não deixa de ser importante na medida em que potencia o sucesso desportivo. Existe uma relação forte entre o sucesso desportivo e as receitas comerciais, as receitas de direitos de transmissão televisiva e as receitas de bilheteira. É, no entanto, ténue a relação entre o sucesso desportivo e as receitas de transferências de atletas. Nesta perspetiva não é necessariamente positivo estar-se no topo do ranking de transferências. 

Por outro lado, contentarmo-nos com a liderança no ranking dos clubes que venderam mais atletas, com algum sucesso interno (as taças da liga contam assim tanto?) e com umas participações honrosas na segunda divisão do futebol Europeu é um registo onde me recuso a estar. 

É a apologia velada do downsizing que conduzirá inevitavelmente a um benfiquinha. 

É a apologia de um Benfica para consumo interno, transformado em entreposto de jogadores e irremediavelmente fora do comboio da elite do futebol mundial. É pactuar com um Benfica transformado em instrumento de interesses obscuros que, quais parasitas, minam o potencial de uma das maiores marcas da indústria do futebol mundial. 

Para concluir, reconheço que, no contexto atual, contratar um treinador com o perfil atrás descrito não é fácil para o atual Benfica. Mas não é fácil sobretudo porque um técnico com tal prestígio dificilmente aceitaria treinar um clube onde tem pouco ou nada a dizer sobre a política de construção do plantel e onde se teria de sujeitar à agenda de transferências da atual liderança e dos seus amigos empresários. 

Não é fácil também porque a atual liderança conseguiu o feito inédito na história centenária do Benfica de prejudicar a reputação do clube, permitindo que o mesmo fosse envolvido em suspeitas de alegadas práticas antidesportivas e ilegais. Não é fácil ainda porque a atual liderança não oferece garantias de um projeto ambicioso que constitua um desafio da magnitude daqueles de que se alimentam os técnicos com o perfil que pretendemos. 

Assim, torna-se evidente que, se queremos rapidamente deixar para trás estes tempos difíceis que o Benfica atravessa, se queremos desenvolver um projeto apaixonante e ambicioso capaz de tornar o Benfica no MAIOR E MELHOR CLUBE DO MUNDO, é urgente substituirmos a liderança do clube. É urgente colocarmos à frente dos destinos do nosso Benfica verdadeiros benfiquistas que sejam competentes, honrem os valores do clube e que consigam aliar a estes requisitos a paixão que nós adeptos sentimos.