A arte de destruir um balneário em menos de um nada

Se há treinador mestre em destruir balneários, José Mourinho tem de estar lá entre os melhores. Os últimos anos provam-no. Não está em causa e nunca estará, a competência do treinador. É dos melhores do mundo, os resultados provam-no.

Não vou aqui discutir o estilo de jogo. Não gosto, é um facto, mas mesmo tendo acompanhado a carreira de José Mourinho sempre de perto, nunca vou conseguir entender o que levou o técnico português a trocar um estilo de jogo que enquanto à frente do FCP me apaixonou, sempre a jogar com olhos na baliza adversária, sempre a pressionar alto e a asfixiar, para um estilo de jogo pobre, ultra-defensivo, enfadonho, conflituoso, em que o objetivo é não deixar jogar bem mais do que tentar jogar.

De facto, a ironia da carreira de Mourinho é que quando passou a poder ter ao seu dispor os melhores jogadores do mundo, foi essa a altura em que Mourinho abdicou do futebol positivo, preferindo deixar de jogar bonito e tornar-se mestre na arte do anti-jogo... Mas que deu resultados muitas vezes, diga-se, e isso é o que fica para a história!

Mas isto para dizer que o que mais registo na carreira de Mourinho é a incapacidade de criar relações duradoura com os seus jogadores... Mourinho falha sempre ao terceiro ano, são factos facilmente comprováveis.

Daquilo que vou vendo e tentando perceber, Mourinho é mestre em chegar a um balneário novo e entrar na mente dos seus jogadores, inventar inimigos externos, criar conflitos com adversários, unir os jogadores em torno de uma causa (muitas vezes imaginária) e tê-los dispostos a morrer por ele...

Mas este estado de quase hipnotismo não dura muito tempo... A corda é esticada de tal maneira ao nível do conflito (incrível esta terrível moda de a cada decisão arbitral haver sempre dois ou três jogadores do Chelsea a esbracejar e a pressionar o árbitro), que até os jogadores percebem um dia que andam a ser manipulados (que a causa foi fabricada), um dia os jogadores acordam, e depois é quase impossível voltar a fazer deles o que antes eram...

Este ano no Chelsea Mourinho tem mostrado como se destrói um balneário em menos de um nada... A maior parte dos jogadores já não estão com ele... Mourinho criou conflitos com Hazard, com Matic, com Terry, com Óscar, como já em Madrid os tinha criado com outras tantas estrelas... Eu ainda me lembro do dia em que publicamente Mourinho decidiu matar Sabry para o futebol numa conferência de imprensa!

Mourinho continua com essa moda tão portuguesa de continuar sempre com a mania dos inimigos externos, com a mania da perseguição, com as desculpas com as arbitragens, o habitual cá na terra, que o mundo está sempre contra ele...

Mas em Inglaterra não... Em Inglaterra isso é quase um anti-cultura... Pode ter piada durante uns meses mas rapidamente passa a aborrecer e a soar a falso! Já nem os jogadores acreditam nisso...

No Match of the Day todos os domingos onde passam os resumos dos jogos, os próprios comentadores (todos eles ex-jogadores) dizem que continuam a adorar Mourinho e que ele faz falta à Premiership, mas que tem de mudar o estilo... Esta moda portuguesa de “a culpa é sempre dos outros e nunca minha” não tem lugar neste país!

E como destruiu Mourinho o balneário do Chelsea?

É simples! Os resultados não apareceram no imediato, e Mourinho teve de arranjar culpados e sacrificar algumas estrelas da equipa... Matic, Hazard e Terry foram para o banco. Mourinho assumiu o confronto, quis mostrar que ele é que manda! Em planteis ricos Mourinho achou que os suplentes iriam dar conta do recado, que o Chelsea iria voltar a ganhar, e a mensagem para as suas estrelas teria provocado o efeito desejado...

Mas o mal é que os suplentes entraram e o Chelsea continuou a perder.... E esta é a fase perigosa... Porque se percebe que os suplentes não servem, e os titulares com quem se assumiu um conflito público (Matic chegou a entrar num jogo como substituto e a sair 20 minutos depois), têm de ser chamados de novo à equipa...

Mas aqui já nada será como antes! Os jogadores, magoados e humilhados, já não estão dispostos a morrer pelo treinador, e o conflito a as divergências são óbvias e latentes!

É isto o que acontece no Chelsea hoje, e a prova de que até mesmo para os grandes treinadores do mundo é extremamente perigoso criar conflitos com as suas estrelas, e culpá-las publicamente quando os maus resultados aparecem.

E que tem isto a ver com o Benfica?

Bem, o desejo apenas de que Rui Vitória não siga este caminho perigoso, de chumbar tudo o que já havia, e apostar apenas em sangue novo sem o respeito devido a quem já cá estava, a quem foi campeão nacional, e que acabou por ficar...

Eu entendo o lançamento de Semedo depois da saída de Maxi...

Eu entendo o lançamento do Guedes depois da saída de Ola John e com Salvio aleijado...

Eu entendo de facto mas, bem mais importante do que eu entender é que o balneário também entende, e isso é o que conta...

Mas acho que o balneário já não entenderá tão bem que Clésio seja lançado com André Almeida no banco...

E acho de muito mau gosto lançar Renato Sanches (não está em causa o seu potencial, mas tem 18 anos caramba!!) quando Cristante está no banco, e também ele espera uma oportunidade há tanto tempo...

Isto é simplesmente assumir num simples segundo que “Tu e tu não contam, e só vão jogar se não houver realmente mais ninguém!”

Estes são os pormenores que destroem balneários e que retiram autoridade aos treinadores...

Isto de colocar em causa as hierarquias que inconscientemente se estabelecem nos balneários, para mais quando essas hierarquias são desfeitas baseadas em critérios qualitativos extremamente duvidosos é um caminho EXTREMAMENTE perigoso.

Se o objetivo é apenas lançar putos sem critério (porque lançar putos dá créditos), que se assuma claramente...

Mas se o objetivo é ainda tentar fazer qualquer coisa positiva desta época em termos de resultados, então talvez ajude focar-nos na base que nos poderá ajudar a conseguir essas vitórias...

...E não, não serão os garotos, por muito que isso custe a alguns. Os miúdos serão sempre um bom complemento se lançados com rigor e critério, mas todos sabemos (os menos cegos pelo menos) que nunca serão eles a base do Benfica ganhador que todos desejamos, pelo menos num futuro imediato.